sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

No que dará o Efeito Tunísia?

"Together we fight against poverty, corruption and injustice” - manifestantes no Iêmen



O Efeito Tunísia é certamente o acontecimento político mais interessante até agora em 2011.

A simples possibilidade de gerar uma “onda” na região, fazendo com que o Magreb e a Península Arábica se modifiquem mais do que nos últimos anos é fascinante.

A coisa começou com a revolta na Tunísia deflagrada a partir do protesto suicida de Mohamed Bouazizi que ateou fogo ao próprio corpo ao não suportar que funcionários corruptos confiscassem seu carro de frutas.

O sucesso do levante popular tunisiano encorajou os povos vizinhos, especialmente a juventude que não aguenta mais estagnação econômica e regimes autoritários. Ignácio Ramonet (traduzido por Marco Aurélio Weissheimer) atesta:

"A derrocada da ditadura na Tunísia foi tão veloz que os demais povos magrebinos e árabes chegaram à conclusão de que essas autocracias – as mais velhas do mundo – estavam na verdade profundamente corroídas e não eram, portanto, mais do que 'tigres de papel'. Esta demonstração está ocorrendo também no Egito [...] a sociedade marroquina está seguindo os acontecimentos da Tunísia e do Egito, com excitação. Preparados para unir-se ao impulso de fervor revolucionário e quebrar de uma vez por todas as travas feudais. E para cobrar todos aqueles que, na Europa, foram cúmplices durante décadas dessas 'ditaduras amigas'"


Atenções voltadas especialmente para o Egito agora por o país ser aliado dos EUA na região e um Estado muito mais importante do que os ao redor. Mauricio Santoro escreveu: “O país que foi um dos centros mais importantes do pan-arabismo tornou-se uma ditadura estagnada economicamente, com um regime decrépito e sem apelo ideológico [...] À semelhança da Tunísia, a incipiente rebelião egípcia é motivada pela falta de oportunidades econômicas e pelo desgosto com a corrupção no governo. Internet, celulares e novas mídias desempenham papel importante na organização e mobilização dos manifestantes”.


A “onda” já atinge Iêmen, Argélia e Síria, segundo o The Guardian "Reverberations from the mass protests in Tunisia and Egypt continued to be felt around the Arab world as demonstrators gathered on the streets of Yemen for a 'day of rage' and Algeria became the latest country to try to defuse tensions by lifting its 19-year state of emergency […]More protests are expected across the region following Friday prayers, including in Syria, where activists have used Facebook to organise demonstrations in front of parliament in the capital, Damascus, and at Syrian embassies across the world […] 'Together we fight against poverty, corruption and injustice,' the protesters at Sana'a University chanted, between intermittent bursts of music and speeches delivered by opposition politicians from Yemen's Islamist, socialist and Nasserite parties”.

Hugo Albuquerque projeta: "Se tivemos mudanças importantes na América Latina na última década, hoje, a grande região que inclui o Magheb e o Oriente Médio sente novos e bons ventos soprando: Somada à decadência dos americanos, a degeneração dos regimes que lhes são fiéis, o avanço tecnológico e o aumento da organização dos movimentos sociais naqueles países estão minando o esquema de Washington"

Ainda há muito para acontecer, mas deve haver muita atenção para o “depois”. Se cair Mubarak, o que vem? Quais as consequências de a Irmandade Muçulmana se agarrar ao poder, ou de um renascimento do pan-arabismo nasserista?

Raphael Neves publicou e-mail de um amigo iraniano que diz: "The revolution in Iran was not Islamic to begin with, it became Islamicized in a brief period of time - in other words there were Islamic, Liberal, Marxist and Nationalist factions, as well as hybrid groups that drew upon several of these ideologies, but the Islamist strand in the end became hegemonic [...] The Muslim Brotherhood is of course the dominant opposition group in the latter case, and they would be the ones most prepared to take over if Mubarak does indeed fall. Yet I don't think that either country will necessarily produce a 'theocratic state'. Islamic factions will undoubtedly play roles in the political milieu of each country, but this doesn’t mean that they will conform to the caricatures of Islamic fundamentalism that are bandied about with such frequency in the Western press".

Segundo Mauricio Santoro: "Na clandestinidade há muitos anos, em tempos recentes costurou acordos com Mubarak, comprometendo-se a não atacar o governo em troca de certa liberdade para atuar por meio de organizações de fachada. A Irmandade é bem organizada e influente, estima-se que controle cerca de 20% dos deputados egípcios, e muitos dos sindicatos. O grande risco é que, num cenário de vácuo de poder, a disciplina e preparo de seus quadros lhe garantisse a liderança do Egito, à semelhança do que houve com os aiatolás no Irã, após a derrubada do xá".

No que dará o Efeito Tunísia?

Certo é que é fantástico por todo o calor político e inssureição que está gerando contra regimes não-democráticos e que está sendo um pesadelo para os EUA. Instabilidade é tudo que eles não querem na região. Novos governos - que não estejam necessariamente vinculados aos interesses estado-unidenses – mudam completamente a geopolítica da África e do Oriente Médio e os resultados disso são imprevisíveis.

É esperar pra ver. E torcer.

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