sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Poema sujo, por Ferreira Gullar



Quando a ascensão social causa medo e perplexidade

Texto do Luiz Carlos Azenha, do Vi o mundo. Os negritos e links são do original.

Há, por toda parte, da direita à esquerda, uma certa perplexidade. Intelectuais à esquerda e à direita se debruçam sobre a campanha eleitoral com uma ponta de saudosismo e desprezo pela aparente despolitização do eleitorado. O domínio do marketing, a presença do Tiririca e a influência de Lula são apontados como sinais de que a democracia brasileira está às vésperas de um naufrágio.

Em um caderno especial, “Desafios do Novo Presidente”, o Estadão exibe sua saudade de um tempo em que ainda era possível controlar o protagonismo das multidões para negociar, por cima, uma “solução política”. Foi assim no movimento das Diretas Já! , em que o vozerio das ruas foi instrumentalizado para buscar uma democracia “de bastidores”. “Democracia à brasileira”, anuncia o Estadão, obviamente sem notar a ironia contida na escolha da foto. Se tivesse escolhido uma imagem da greve dos metalúrgicos do ABC, em 1980, não seria, naturalmente, o Estadão, embora a greve tenha sido o golpe que de fato chacoalhou o regime militar.

Na Folha, um colunista identificou no Tiririca o símbolo de tudo o que há de errado com a política brasileira. Ele se esqueceu que a despolitização é herança da cidadania negada e está explícita não só nos candidatos bizarros, mas também em partidos que não resistem a prévias internas para a escolha do candidato a presidente. O dedaço, como se sabe, é um mal apenas quando praticado pelo atual presidente da República, nunca quando se dá em um apartamento de Higienópolis. Politização exige engajamento. A amnésia do colunista se estende à campanha movida contra as tênues tentativas do governo Lula de promover a cidadania política, através das conferências nacionais e do Plano Nacional de Direitos Humanos, campanha da qual fez parte… a Folha.

O Globo de domingo gastou uma página inteira de papel e tinta para falar em Vazio de ideias, por que a apatia e a ausência de reflexão tomaram conta da campanha eleitoral. Na página, o poeta Claufe Rodrigues prega “mudar radicalmente o sistema de representação”. Será que ele sonha com o voto censitário? O jornalista Eugenio Bucci trata como “discurso autoritário” a propaganda eleitoral de Dilma Rousseff que dá ênfase à ascensão social (‘”pusemos” não sei quantos brasileiros na classe média’). O sociólogo Bernardo Sorj fala em “massa apática”, sustentada pela “classe média pagadora, que se preocupa com problemas como liberdade de expressão, transparência do Estado e corrupção”.

Curiosamente, as pílulas de O Globo revelam mais sobre os entrevistados do que sobre a população brasileira, os eleitores brasileiros e a conjuntura política e econômica do Brasil. Revelam desconhecimento, preguiça intelectual e a falta de reflexão que eles, os entrevistados, preferem atribuir — como sempre — “aos outros”.

Infelizmente, pouca gente tem se dedicado até agora a estudar a erupção política de milhões de brasileiros como resultado da ascensão social que eles viveram nos últimos anos. O fenômeno, em números, foi retratado mais recentemente no estudo A Nova Classe Média: o Lado Brilhante dos Pobres, da Fundação Getúlio Vargas. Do ponto de vista da ciência política, foi estudado por André Singer, em Raízes sociais e ideológicas do Lulismo.

Além da ignorância, no entanto, torcer o nariz para a atual campanha eleitoral também serve a um objetivo político: desqualificar antecipadamente os eleitos. Para além do golpismo, no entanto, está a perplexidade de classe — e aqui localizamos a esquina onde se encontram direitistas e esquerdistas (alguns, pelo menos). O Brasil é um país de extrema concentração de poder, de riqueza e de saber. E o fenômeno que vai influenciar as eleições brasileiras a longo prazo representa uma ameaça a essa sociedade, em que as “ideias” políticas, de comportamento e de consumo “vertem” dos ungidos em direção às massas.

Assistimos, em câmera lenta, a uma revolução nos papéis sociais, que vai se acelerar quando a ascensão econômica se combinar com a interiorização do conhecimento, o acesso à universidade e as tecnologias de informação.

Perplexos, os que se acreditam mantenedores de nossa ordem hierarquizada confundem sua irrelevância com a decadência definitiva da democracia brasileira. É um jeito elegante de dizer que eles sentem desprezo pelos pobres.


sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Em defesa da riqueza ambiental do sul do Brasil








Só alguns problemas

"Além da maioria das guerras, as cruzadas, a Inquisição, 11 de setembro, casamentos arranjados com crianças, bombardear escolas de meninas, a opressão às mulheres e aos homossexuais, fatwas, limpezas étnicas, estupros pela honra, sacrifícios humanos, queima de bruxas, homens-bomba, aprovar a escravidão e o estupro sistemático de crianças...são algumas coisinhas com as quais eu tenho problema"





Vídeo retirado do Bule Voador
Imagem: The Crusaders, de Mark Bryan



"Uma justiça cara, confusa, lenta e ineficiente"

Texto retirado do Espaço Vital:

A ministra Eliana Calmon, do STJ, ao ser empossada, anteontem (8), no cargo de corregedora do Conselho Nacional de Justiça, lembrou que, com a criação do CNJ, afinal, depois de dois séculos, a Justiça brasileira foi avaliada, em números e em custo.
"Pela primeira vez, foram feitos diagnósticos oficiais do funcionamento da prestação jurisdicional, dos serviços cartorários. Pela primeira vez, veio a conhecimento de todos, até dos próprios protagonistas da função judicante, o resultado de uma justiça cara, confusa, lenta e ineficiente", destacou.

Ao prestar o juramento de posse, Eliana Calmon afirmou que pendura a toga, que usou durante 32 anos, para enfrentar o maior desafio da sua vida profissional.
"Estou pronta para, pela primeira vez, deixar a atividade judicante e assumir a função de fiscalizar a distribuição da justiça e o andamento dos serviços forenses, funções estatais divorciadas dos mandamentos constitucionais. A Constituição Federal garante a razoável duração do processo e dos meios de celeridade de sua tramitação. Mas sabemos todos, profissionais do direito e cidadãos, o descompasso da realidade com a ordem constitucional".

O discurso da ministra foi cheio de frases surpreendentes. Num trecho ela se dirige aos próprios colegas que prestam a demora jurisdição. "Não podemos mais esperar e - na urgência urgentíssima em que nos encontramos - é preciso que todos nós, magistrados, acreditando no Judiciário, passemos a desconstruir o castelo burocrático de um falido sistema de pseudos disciplinados e hipócritas profissionais para, com coragem, não só aceitarmos as mudanças, mas delas também participarmos, quebrando paradigmas na certeza de que, sem um Judiciário eficiente, será inteiramente impossível a funcionalidade estatal”.
Segundo a nova corregedora nacional de Justiça, o projeto piloto do programa Justiça em Dia será implantado primeiramente nos Tribunais Regionais Federais, em parceria com o Conselho da Justiça Federal e a Associação dos Juízes Federais. O projeto se propõe a proporcionar um julgamento rápido ao mesmo tempo em que oferecerá assessoria de gestão individualizada a cada gabinete.
Depois, o Justiça em Dia será estendido também a Justiça Estadual para, ao final, “devolver aos julgadores a auto-estima perdida e a credibilidade abalada” - segundo a ministra.
Ela disse ainda que, como prioridade de sua gestão, nos próximos dois anos à frente da Corregedoria Nacional de Justiça irá fortalecer as Escolas de Magistraturas, ensinando ao magistrado ser a sua atividade muito maior e além de dar uma sentença ou assinar um despacho”.
Em sua gestão, ela contará com o apoio dos juízes Ricardo Chimenti e Nicolau Lupianhaes Neto, que iniciaram os trabalhos na gestão passada do CNJ, e do juiz Erivaldo Ribeiro dos Santos, que volta ao CNJ para auxiliá-la, após ter passado pela presidência do Conselho.

Outros dois novos juízes auxiliares farão parte de sua equipe: Agamenilde Dias Arruda Dantas, titular de uma das Varas de Família de João Pessoa (PB) e Júlio César Machado de Melo, juiz de Florianópolis (SC).
Também farão parte da equipe, como assessores especiais, os desembargadores (aposentado) Vladimir Passos de Freitas (que atuou no TRF-4) e Silvio Marques Neto, do TJ de São Paulo.
Ao declarar empossada a ministra no cargo de corregedora nacional de Justiça, o presidente do CNJ e do STF, ministro Cezar Peluso, lembrou que, como magistrada de carreira, "ela conhece bem os pecados, as ineficiências e disfunções do Judiciário", reconhecendo que "a ministra tem a sensibilidade, determinação e coragem suficientes para aprimorar o trabalho que deu ao CNJ uma imagem nova mediante ações eficientes".

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A morte está acabada




"Para ele tudo aconteceu em um único instante e a sensação daquele instante não mudou dali em diante. Para os que presenciaram sua agonia, esta durou mais duas horas. De sua garganta ainda saía um som e via-se um estranho movimento de seu corpo já sem vida. Até que a respiração ofegante e o som passaram a vir em intervalos cada vez maiores.

- Acabou! - disse alguém perto dele, o que ele repetiu dentro de sua alma.

'A morte está acabada', disse para si mesmo. 'Não existe mais.'

Respirou profundamente, parou no meio de um suspiro, esticou o corpo e morreu"



Trecho de A morte de Ivan Ilitch, de Liev Tolstoi

Imagem: O Corvo, de Gustave Doré