sábado, 2 de julho de 2011

Se os Tubarões Fossem Homens




Bertold Brecht

Se os tubarões fossem homens, eles seriam mais gentís com os peixes pequenos. Se os tubarões fossem homens, eles fariam construir resistentes caixas do mar, para os peixes pequenos com todos os tipos de alimentos dentro, tanto vegetais, quanto animais. Eles cuidariam para que as caixas tivessem água sempre renovada e adotariam todas as providências sanitárias cabíveis se por exemplo um peixinho ferisse a barbatana, imediatamente ele faria uma atadura a fim de que não moressem antes do tempo. Para que os peixinhos não ficassem tristonhos, eles dariam cá e lá uma festa aquática, pois os peixes alegres tem gosto melhor que os tristonhos.

Naturalmente também haveria escolas nas grandes caixas, nessas aulas os peixinhos aprenderiam como nadar para a guela dos tubarões. Eles aprenderiam, por exemplo a usar a geografia, a fim de encontrar os grandes tubarões, deitados preguiçosamente por aí. Aula principal seria naturalmente a formação moral dos peixinhos. Eles seriam ensinados de que o ato mais grandioso e mais belo é o sacrifício alegre de um peixinho, e que todos eles deveriam acreditar nos tubarões, sobretudo quando esses dizem que velam pelo belo futuro dos peixinhos. Se encucaria nos peixinhos que esse futuro só estaria garantido se aprendessem a obediência. Antes de tudo os peixinhos deveriam guardar-se antes de qualquer inclinação baixa, materialista, egoísta e marxista. E denunciaria imediatamente os tubarões se qualquer deles manifestasse essas inclinações.

Se os tubarões fossem homens, eles naturalmente fariam guerra entre si a fim de conquistar caixas de peixes e peixinhos estrangeiros.As guerras seriam conduzidas pelos seus próprios peixinhos. Eles ensinariam os peixinhos que, entre os peixinhos e outros tubarões existem gigantescas diferenças. Eles anunciariam que os peixinhos são reconhecidamente mudos e calam nas mais diferentes línguas, sendo assim impossível que entendam um ao outro. Cada peixinho que na guerra matasse alguns peixinhos inimigos da outra língua silenciosos, seria condecorado com uma pequena ordem das algas e receberia o título de herói.

Se os tubarões fossem homens, haveria entre eles naturalmente também uma arte, haveria belos quadros, nos quais os dentes dos tubarões seriam pintados em vistosas cores e suas guelas seriam representadas como inocentes parques de recreio, nas quais se poderia brincar magnificamente. Os teatros do fundo do mar mostrariam como os valorosos peixinhos nadam entusiasmados para as guelas dos tubarões.A música seria tão bela, tão bela, que os peixinhos sob seus acordes e a orquestra na frente, entrariam em massa para as guelas dos tubarões sonhadores e possuídos pelos mais agradáveis pensamentos. Também haveria uma religião ali.

Se os tubarões fossem homens, eles ensinariam essa religião. E só na barriga dos tubarões é que começaria verdadeiramente a vida. Ademais, se os tubarões fossem homens, também acabaria a igualdade que hoje existe entre os peixinhos, alguns deles obteriam cargos e seriam postos acima dos outros. Os que fossem um pouquinho maiores poderiam inclusive comer os menores, isso só seria agradável aos tubarões, pois eles mesmos obteriam assim mais constantemente maiores bocados para devorar. E os peixinhos maiores que deteriam os cargos valeriam pela ordem entre os peixinhos para que estes chegassem a ser, professores, oficiais, engenheiros da construção de caixas e assim por diante. Curto e grosso, só então haveria civilização no mar, se os tubarões fossem homens.




sexta-feira, 29 de abril de 2011

Pequena análise da Revolução de Jasmim


O texto abaixo foi produzido para a disciplina de Psicologia Social I e pretende responder a partir da leitura de uma notícia às questões:

1)Como a relação entre indivíduo e sociedade aparece na reportagem?

2)A reportagem se enquadra em alguma das doutrinas expostas por Asch ( Tese Individualista ou Tese da Mentalidade Coletiva) ?

Obs.: tive que arrumar o sistema de citações pra colocar aqui, tentei deixar da forma mais simples possível. Essa formatação do blogspot é realmente irritante.

Notícia: O estopim das revoltas no Oriente Médio ocorridas a partir da Tunísia, onde Mohamed Bouazizi ateou fogo ao próprio corpo.

“O rapaz havia se formado na universidade, mas sem emprego teve que trabalhar como vendedor de rua. Quando autoridades corruptas confiscaram sua barraca, sua angústia foi tão grande que ele se suicidou em plena rua, colocando fogo ao próprio corpo. Muitos se identificaram com seu sofrimento e ele virou um símbolo para as injustiças do país, inclusive para a rede de corrupção que ia da família Ben Ali aos funcionários mais subalternos do Estado.”

Fonte: http://todososfogos.blogspot.com/2011/01/rebeliao-na-tunisia-e-democracia-no.html

“Twenty-six-year-old Mohamed Bouazizi, living in the provincial town of Sidi Bouzid, had a university degree but no work. To earn some money he took to selling fruit and vegetables in the street without a licence. When the authorities stopped him and confiscated his produce, he was so angry that he set himself on fire.


Rioting followed and security forces sealed off the town. On Wednesday, another jobless young man in Sidi Bouzid climbed an electricity pole, shouted "no for misery, no for unemployment", then touched the wires and electrocuted himself.


On Friday, rioters in Menzel Bouzaiene set fire to police cars, a railway locomotive, the local headquarters of the ruling party and a police station. After being attacked with Molotov cocktails, the police shot back, killing a teenage protester.


By Saturday, the protests had reached the capital, Tunis – and a second demonstration took place there yesterday”

Fonte: http://www.guardian.co.uk/commentisfree/2010/dec/28/tunisia-ben-ali


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A ação tomada a cabo por Mohamed Bouazizi é um fato rico para estudo em Psicologia Social. Como este ato isolado (se é que um ato pode ser isolado) pôde desencadear a Revolução de Jasmim que retirou do poder o ditador Zine El Abidine Ben Ali e espraiou para a região uma onda de revoltas populares?

Não há aqui a pretensão de analisar especificidades das revoltas, entretanto um detalhe comum a estes movimentos é importante a ser elencado: a organização e divulgação através das novas redes sociais. Sobre esta situação deve-se atentar para a afirmativa de Guareschi[1] de que O Zeitgeist, hoje, é a comunicação. A comunicação permeia todo o raciocínio da análise que se pretende aqui.

Como a relação entre indivíduo e sociedade aparece na reportagem? Bouazizi havia passado por diversas humilhações, tentou conversar com o governador local, mas não foi atendido, não conseguiu estabelecer uma relação cidadã com a autoridade, foi impedido de se comunicar, de se relacionar de maneira democrática com sua pólis. A situação de um governo autoritário, cerceador de oportunidades e de diálogo com o povo - representado por Bouazizi - concretiza dominação, supressão de direitos, tensão sobre esse povo. Thompson[2] afirma que Interpretar a ideologia é explicar a conexão entre o sentido mobilizado pelas formas simbólicas e as relações de dominação que este sentido ajuda a estabelecer e sustentar. A dominação é latente em um governo que desconsidera o demos, e assim a cidadania, torna o sujeito despossuído de participação. Tal regime se sustenta por meio de métodos de coerção, pois não possui forças que o legitimem, já que a autoridade só possui sentido quando é legitimada pelo povo.

Decorrente desta forte tensão social, Bouazizi recorreu ao ato mais desesperado para poder se comunicar, sacrificou seu corpo como símbolo, oferecendo-o para que o mundo enxergasse sua sociedade e sua condição. Deixou uma última mensagem no site de relacionamentos Facebook (e aqui voltamos para o papel das novas redes sociais):

“Estou viajando mãe. Perdoe-me. Reprovação e culpa não vão ser úteis. Estou perdido e está fora das minhas mãos. Perdoe-me se não fiz como você disse e desobedeci suas ordens. Culpe a era em que vivemos, não me culpe. Agora vou e não vou voltar. Repare que eu não chorei e não caíram lágrimas de meus olhos. Não há mais espaço para reprovações ou culpa nessa época de traição na terra do povo. Não estou me sentindo normal e nem no meu estado certo. Estou viajando e peço a quem conduz a viagem esquecer”[3]

Cabe aqui a constatação de Marcuse[4]: Se são violentos é porque estão desesperados. Thompson[5] assinala que As ações simbólicas podem provocar reações, liderar respostas de determinado teor, sugerir caminhos e decisões, induzir a crer e a descrer, apoiar os negócios do estado ou sublevar as massas em revolta coletiva. É isto que se vê claramente no ato do tunisiano, desencadeador de um efeito dominó, o já chamado “Efeito Tunísia” que está abalando os governos da região, como Egito, Líbia, Síria, Bahrein. Para a divulgação e, podemos dizer, propulsão deste efeito, o poder de organização através da internet tem se mostrado essencial, e aqui percebemos concretamente a afirmativa de Guareschi[1] de que a comunicação, hoje, constrói a realidade. A comunicação entre sociedades tensionadas por governos repressores é o que está corroendo estes mesmo governos. Verificamos uma dinâmica comunicativa (sintetizada na figura abaixo), de relações, intra e intersociedades, mesmo com as tentativas coercitivas de cerceamento da liberdade de expressão, cerceamento este que a internet vem tangenciando.



A partir da nova relação governo-sociedade o povo retoma a soberania, entendida aqui conforme o formulado por Reale[6]: o poder de organizar-se juridicamente e de fazer valer dentro de seu território a universalidade de suas decisões nos limites dos fins éticos de convivência. Com este conceito verifica-se o desmoronamento do poder autoritário de exceção e a formação de umnovo contrato social, uma nova relação do sujeito com a pólis, com a comunidade que legitima as novas autoridades. Participação é comunicação, seja em regimes democráticos, comunistas, anárquicos, o que dá sentido, o que constrói a autoridade é o povo, como titular da soberania que se comunica, que sustenta o poder. Importante também dentro do conceito de Reale a necessidade de a soberania constituir-se de fins éticos, Guareschi[7] nos ensina que ética não pode ser considerada fora das relações, ninguém é ético sozinho: só podemos falar em ética no contexto de relações.

Solomon Asch[8], em seu Psicologia Social, nos apresenta a Tese Individualista e a Tese da Mentalidade Coletiva, doutrinas que à época dividiam as ciências sociais. Para a Tese Individualista o indivíduo é a única realidade, os processos psicológicos se desenvolvem somente no indivíduo, é a única unidade acessível à observação, somente ele decide e age. Verifica-se uma conexão entre tal concepção e a Cosmovisão do Liberalismo Individualista, para este entendimento o indivíduo é separado do grupo, é o divisum a quolibet alio (separado de tudo mais), é um sujeito solipsista, egocentrado. A Tese da Mentalidade Coletiva entende que o sujeito se perde no grupo, os seres são apenas instrumentos pelos quais as forças culturais agem. Relacionada a esta teoria está a Concepção do Totalitarismo Coletivista[9] que toma o homem como peça do sistema, massificado pelo coletivo.

Entende-se aqui que nenhuma das doutrinas extremas apresentadas por Asch satisfazem a análise de um fato como o apresentado a partir da ação desesperada de Mohamed Bouazizi. Asch assinala que

Os fatos coletivos precisam ter seu fundamento nos indivíduos; a consciência do grupo, as intenções e os valores do grupo existem nos indivíduos e somente neles. Mas deixam de ser simplesmente fatos individuais em virtude de sua referência a outros. Conclui-se que um processo de grupo não é a soma de atividades individuais nem um fato acrescentado às atividades dos indivíduos

Posição semelhante ao já visto raciocínio de Guareschi quando este trata da ética. A relação, a comunicação é por demais complexa para ser bem compreendida se enquadrada em uma das teorias dicotômicas. Estudos sobre fatos tão complexos como o apresentado necessitam de uma relação de conhecimentos interdisciplinar, para tal devemos relembrar do ensinamento de Martín-Baró:[10]


Não se trata de abandonar a psicologia; trata-se de colocar o saber psicológico a serviço da construção de uma sociedade em que o bem estar dos menos não se faça sobre o mal estar dos mais, em que a realização de alguns não requeira a negação dos outros, em que o interesse de poucos não exija a desumanização de todos.



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[1] Mídia e Democracia: o quarto versus o quinto poder. REVISTA DEBATES, Porto Alegre, v.1, n.1, p. 6-25, jul.-dez. 2007

[2] Citado por Marília Veronese e Pedrinho Guareschi em: VERONESE, M e GUARESCHI, P. Hermenêutica de Profundidade na pesquisa social. Ciências Sociais Unisinos, v.42, n.2, maio-ago., 2006

[3] Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Mohamed_Bouazizi>. Acesso em: 26 março 2011

[4] Citado por Arminda Aberastury em: ABERASTURY, A. e KNOBEL, M. Adolescência normal: Um enfoque psicanalítico. Porto Alegre: Artes médicas, 1981.

[5] THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. SãoPaulo: Editora Vozes 1995.

[6] Citado por Dalmo de Abreu Dallari em: DALLARI, D de A. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2010.

[7] GUARESCHI, P.Psicologia Social Crítica: como prática de libertação.Porto Alegre:EDIPUCRS, 2009

[8] ASCH, S. E. Psicologia Social. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971.

[9] As concepções de Liberalismo Individualista e de Totalitarismo coletivista são apresentadas por Guareschi em: GUARESCHI,P.Psicologia Social Crítica: como prática de libertação.Porto Alegre:EDIPUCRS, 2009

[10] Estudos de Psicologia 1996, 2(1), 7-27


quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

São Paulo e poesia


Passei pouco mais de dez dias em São Paulo este mês. Desta vez pude conhecer um pouco mais da cidade depois de um final de semana fantástico na praia de Ubatuba. Pra quem for pra capital financeira do país recomendo começar a conhecê-la pelo centro: Praça da Sé, Pátio do Colégio, Centro Cultural Banco do Brasil e depois passar na Liberdade pra conhecer as lojas que nos transportam para o Japão, comer espetinho de camarão "bem balato" e guioza.


Outra parte importante a se conhecer é a área próxima à Estação da Luz, que tem ao seu lado: Pinacoteca, Museu da Língua Portuguesa, Memorial da Resistência e prédios que mais parecem depósito de gente



O Museu da Língua Portuguesa é imperdível, com sessão de um vídeo, narrado pela Fernanda Montenegro, que conta a gênese das línguas, depois a tela se levanta e dá acesso a uma sala escura com projeções de luz e narrações de poesias. A primeira a ser ouvida, e não caberia outra melhor ali, é um único verso de Procura da Poesia, do Drummond: Penetra surdamente no reino das palavras



O Museu da Resistência é um projeto que deveria ser reproduzido em outras cidades que sofreram forte repressão pelas nossas ditaduras, o Estado Novo de Vargas e a reinvenção do Plano Cohen do Gegê: o Regime de 64.




Bom também dar uma caminhada pela Paulista, a Wall Street tupiniquim, pra perceber o "espírito" de São Paulo, os prédios, as antenas, as lojas e pensar nos pobres de São Paulo. E pra contrabalancear a Paulista, ir até o Parque Ibirapuera e alugar um bibicleta pra dar umas pedaladas, além de visitar o Museu de Arte Contemporânea (que não me impressionou nem um pouco), o Museu de Arte Moderna e o Museu Afro Brasil (que tem muito material bom, mas é tanta coisa que fica uma certa poluição visual)



Mas na verdade a ideia pra esse post não era falar da viagem, e sim colocar um poema do Fernando Pessoa/Alberto Caeiro que o Mario - que foi um baita hospedeiro pra mim e pro Ismael, meu parceiro de viagem e de vida há uns 20 anos - me mostrou lá em São Paulo. Depois que ele leu fiquei um tempo pensando se já tinha lido algo tão bom do Pessoa. Tudo bem que minha preferência é pelo tensionamento do Álvaro de Campos, mas Caeiro é o Mestre e esse poema é um dos melhores que já li do Pessoa. Que aliás estava com uma ótima exposição no Museu da Língua Portuguesa


Manuscrito com dois poemas de Caeiro, uma ode de Ricardo Reis e um poema de Pessoa escritos no mesmo dia:



Agora me dei conta de que o Rodrigo já havia feito um post com esse poema declamado pela Maria Bethânia. Boto o vídeo aqui também.



Num meio-dia de fim de primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.

Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.
Era nosso de mais para fingir
De segunda pessoa da trindade.
No céu era tudo falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas –
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque não era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era uma mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o sol
E desceu pelo primeiro raio que apanhou.

Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar no chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou –
«Se é que ele as criou, do que duvido» -.
«Ele diz, por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres».

E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.

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Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural,
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre,
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E a outra a tudo o que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é o de saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos os dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos às cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo um universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri, porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos os muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate as palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

.................................................................

Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.
..................................................................

Esta é a história do meu Menino Jesus.
Po que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

No que dará o Efeito Tunísia?

"Together we fight against poverty, corruption and injustice” - manifestantes no Iêmen



O Efeito Tunísia é certamente o acontecimento político mais interessante até agora em 2011.

A simples possibilidade de gerar uma “onda” na região, fazendo com que o Magreb e a Península Arábica se modifiquem mais do que nos últimos anos é fascinante.

A coisa começou com a revolta na Tunísia deflagrada a partir do protesto suicida de Mohamed Bouazizi que ateou fogo ao próprio corpo ao não suportar que funcionários corruptos confiscassem seu carro de frutas.

O sucesso do levante popular tunisiano encorajou os povos vizinhos, especialmente a juventude que não aguenta mais estagnação econômica e regimes autoritários. Ignácio Ramonet (traduzido por Marco Aurélio Weissheimer) atesta:

"A derrocada da ditadura na Tunísia foi tão veloz que os demais povos magrebinos e árabes chegaram à conclusão de que essas autocracias – as mais velhas do mundo – estavam na verdade profundamente corroídas e não eram, portanto, mais do que 'tigres de papel'. Esta demonstração está ocorrendo também no Egito [...] a sociedade marroquina está seguindo os acontecimentos da Tunísia e do Egito, com excitação. Preparados para unir-se ao impulso de fervor revolucionário e quebrar de uma vez por todas as travas feudais. E para cobrar todos aqueles que, na Europa, foram cúmplices durante décadas dessas 'ditaduras amigas'"


Atenções voltadas especialmente para o Egito agora por o país ser aliado dos EUA na região e um Estado muito mais importante do que os ao redor. Mauricio Santoro escreveu: “O país que foi um dos centros mais importantes do pan-arabismo tornou-se uma ditadura estagnada economicamente, com um regime decrépito e sem apelo ideológico [...] À semelhança da Tunísia, a incipiente rebelião egípcia é motivada pela falta de oportunidades econômicas e pelo desgosto com a corrupção no governo. Internet, celulares e novas mídias desempenham papel importante na organização e mobilização dos manifestantes”.


A “onda” já atinge Iêmen, Argélia e Síria, segundo o The Guardian "Reverberations from the mass protests in Tunisia and Egypt continued to be felt around the Arab world as demonstrators gathered on the streets of Yemen for a 'day of rage' and Algeria became the latest country to try to defuse tensions by lifting its 19-year state of emergency […]More protests are expected across the region following Friday prayers, including in Syria, where activists have used Facebook to organise demonstrations in front of parliament in the capital, Damascus, and at Syrian embassies across the world […] 'Together we fight against poverty, corruption and injustice,' the protesters at Sana'a University chanted, between intermittent bursts of music and speeches delivered by opposition politicians from Yemen's Islamist, socialist and Nasserite parties”.

Hugo Albuquerque projeta: "Se tivemos mudanças importantes na América Latina na última década, hoje, a grande região que inclui o Magheb e o Oriente Médio sente novos e bons ventos soprando: Somada à decadência dos americanos, a degeneração dos regimes que lhes são fiéis, o avanço tecnológico e o aumento da organização dos movimentos sociais naqueles países estão minando o esquema de Washington"

Ainda há muito para acontecer, mas deve haver muita atenção para o “depois”. Se cair Mubarak, o que vem? Quais as consequências de a Irmandade Muçulmana se agarrar ao poder, ou de um renascimento do pan-arabismo nasserista?

Raphael Neves publicou e-mail de um amigo iraniano que diz: "The revolution in Iran was not Islamic to begin with, it became Islamicized in a brief period of time - in other words there were Islamic, Liberal, Marxist and Nationalist factions, as well as hybrid groups that drew upon several of these ideologies, but the Islamist strand in the end became hegemonic [...] The Muslim Brotherhood is of course the dominant opposition group in the latter case, and they would be the ones most prepared to take over if Mubarak does indeed fall. Yet I don't think that either country will necessarily produce a 'theocratic state'. Islamic factions will undoubtedly play roles in the political milieu of each country, but this doesn’t mean that they will conform to the caricatures of Islamic fundamentalism that are bandied about with such frequency in the Western press".

Segundo Mauricio Santoro: "Na clandestinidade há muitos anos, em tempos recentes costurou acordos com Mubarak, comprometendo-se a não atacar o governo em troca de certa liberdade para atuar por meio de organizações de fachada. A Irmandade é bem organizada e influente, estima-se que controle cerca de 20% dos deputados egípcios, e muitos dos sindicatos. O grande risco é que, num cenário de vácuo de poder, a disciplina e preparo de seus quadros lhe garantisse a liderança do Egito, à semelhança do que houve com os aiatolás no Irã, após a derrubada do xá".

No que dará o Efeito Tunísia?

Certo é que é fantástico por todo o calor político e inssureição que está gerando contra regimes não-democráticos e que está sendo um pesadelo para os EUA. Instabilidade é tudo que eles não querem na região. Novos governos - que não estejam necessariamente vinculados aos interesses estado-unidenses – mudam completamente a geopolítica da África e do Oriente Médio e os resultados disso são imprevisíveis.

É esperar pra ver. E torcer.

sábado, 25 de dezembro de 2010

O mais lindo que já li sobre o Natal

Postado em novembro de 2009 pelo Milton Ribeiro:

História de Natal

Aos três anos de idade, Maria foi entregue ao Templo a fim de dedicar sua vida a Deus. Era uma das muitas meninas que lá executavam todo gênero de trabalhos, desde os manuais até os de limpeza; nas horas vagas, oravam e liam as Escrituras. Um dia, aos 13 anos, notou em suas roupas as manchas vermelhas que a impediriam de continuar. Tornara-se alguém passível de contaminar a pureza das outras virgens do Templo; então, foi posta à disposição dos homens. Acostumada a não decidir sobre seu destino, não ficara muito surpresa com a resolução que sorrateiramente seu corpo tomara.

Havia uma espécie de loteria da qual participavam os solteiros e viúvos que desejassem esposas e José ganhou Maria. José era um velho — caminhava com o auxílio de um cajado — e tinha outros filhos: Tiago, José, Simão e Judas. Ele não necessitava de mulher a fim de satisfazer sua rara concupiscência, mas precisava de alguém que fizesse o trabalho diário de casa e para isso Maria servia. Tendo vivido no Templo, era certamente prendada. Porém, muito magra e amedrontada, não o motivava a nada, talvez nem a seus filhos. Seria fácil manterem distância de sua mulher. Após o casamento, José deixou Maria intocada e acabou por abandoná-la por quatro longos anos, pois fora chamado a um trabalho fora da Judéia, mais exatamente em sua Galiléia natal.

Enquanto isso, ela seguia realizando o trabalho doméstico para o qual fora treinada no Templo: alimentava os filhos do marido, lavava e costurava roupas, mantinha a casa em ordem e procurava não ficar íntima dos rapazes. Sabia que sua posição de “esposa” pressupunha uma postura estranha junto aos filhos de seu marido. Era mais jovem do que eles, então retraía-se, o que para ela, crassa tímida, era fácil. Suas horas mais felizes eram aquelas poucas que passava nas feiras, trazendo a matéria-prima para as refeições do dia seguinte e admirando as roupas e tecidos. Pensava ser pecado a vaidade, mas como resistir ao colorido deles? Perguntava repetidas vezes seus preços de alguns deles, esperando até que baixassem. Comprava bastante, pois a costura fazia parte de suas funções e os homens da casa frequentemente estragavam suas vestes na lida. Como não tinham muito dinheiro, ela pechinchava, perdia a timidez e tornava-se conhecida dos vendedores. Algumas vezes, fora advertida de que as roupas que fazia ganhavam detalhes insperados, femininos. Os rapazes riam daquelas manias de menina de Maria. Gostavam dela, era como uma irmã mais nova para eles.

Certo dia, um desses comerciantes a atraiu para sua casa a fim de que ela visse alguns tecidos, verdadeiras maravilhas à preços módicos. Maria, correspondendo a seus convites, passou a visitá-lo em sua casa. Repugnava-lhe a forma como ele um dia a tratou e tinha absoluta certeza de estar fazendo algo errado, mas tinha receio do que o comerciante poderia dizer na feira. O fato repetiu-se. Os filhos de José não se davam conta de que Maria passara a possuir provisões extras de tecidos, de comida e de quinquilharias para a casa e para si. O que lhes importava é que seus serviços permanecessem de acordo com suas necessidades e neste quesito Maria era impecável. Porém, ela tinha repetidos pesadelos em que era punida severamente por seu comportamento. Neles, sempre estava presente José e seus filhos, acusando-a de ser má esposa. Muitas vezes era assassinada; outras vezes, enfrentava tribunais nos quais o comerciante a culpava por seduzi-lo e acabava condenada aos piores suplícios. Na verdade, o que Maria desejava era ter José de volta. Fantasiava com um tratamento mais viril de sua parte. Afinal, com quase 16 anos, já era uma mulher.

O anúncio do retorno de José coincidiu com a interrupção de sua menstruação e com o arredondamento de suas formas. O bico de seus seios machucavam-se contra os tecidos novos de suas roupas, os vômitos tornaram-se frequentes e sua barriga começou a adquirir um inequívoco formado convexo. José retornou e impressionou-se com Maria. Ela tinha a sua altura e, contrariamente a quatro anos, falava, dava ordens em casa e era bonita. Naquela noite, José abraçou-a carinhosamente, de um modo que fez com ela se abandonasse a ele. Ele sentiu em si o bojo crescente no ventre de Maria e perguntou-lhe o que aquilo significava. Maria abraçou-se a ele e, chorando, contou-lhe que tivera um sonho em que um anjo lhe penetrara e que, pela manhã, estava suja de sangue. Disse-lhe que o filho era daquele anjo. Só podia.

José não era um cético, longe disto, mas resolveu perguntar a seu filho Tiago — logo a ele, depois autor de um evangelho apócrifo — sobre a conduta de Maria durante sua ausência. Este assegurou-lhe que Maria era uma boa e fiel esposa, que nunca faltara-lhes nada e que ela os tratava com amor e respeito. José estava confuso, sentia-se sozinho com sua dúvida. Preocupava-se com o que os outros iam dizer de uma gravidez tão imediata a seu retorno e proibiu Maria de sair de casa. Aquela seria a solução: ninguém a veria grávida, veriam apenas a criança depois de nascida e diriam que o parto fora abreviado, que a criança nascera antes, algo assim. No fundo, depois de tantos anos longe, José queria sua esposa e seu filho, precisava da convivência e da companhia deles. Além disto, havia outros motivos para preocupações.

Herodes havia mandado matar todas as crianças da Judéia e José estava preparando-se para esconder seu filho. Jesus nasceu e José decidiu partir novamente, desta vez levando sua família. Na estrada, pararam para descansar numa estrebaria fora de uso, colocando o bebê sobre uma manjedoura. Estavam famintos quando viram três homens cambaleantes se aproximando. Seus hálitos de vinho foram sentidos por Maria e pelos irmãos de Jesus à distância. Eram bons homens que, ao verem a dificuldade daquela família, ofereceram-lhes algum dinheiro, insenso e mirra. José ficou com o dinheiro — que resolveria seus problemas imediatos — e com o insenso. Gostou do trio. Devolveu-lhes a mirra por não saber do que se tratava. Quando perguntou quem eram, eles brincaram, afirmando serem reis magos. José riu, bebeu com eles de seu vinho e dormiu, sonhando com um grande futuro para seu filho. Viu-o embrulhado num manto, vestido como se fosse uma espécie de santo. Na manhã seguinte, seguiram para a Galiléia.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

A fé não faz mal

O vídeo abaixo é um vitória da violência cruel, do machismo, do fanatismo. A mulher foi condenada a chibatadas por usar calças sob as vestes muçulmanas.

É triste, e nós somente nos surpreendemos porque não temos o conhecimento de como estas coisas estão acontecendo por aí todos os dias.

O costume, as tradições, não podem servir de desculpa para a brutalidade.

Daniel Dennett em recente entrevista para o Jornal da Universidade afirmou que:
Religiões são fenômenos tão importantes que precisamos estudá-los com todos os recursos disponíveis, e isso quer dizer que precisamos arrancar o véu, temos que parar de ser hiper-respeitosos com relação à religião




O texto abaixo é de Eduardo Patriota Gusmão Soares, via Bule Voador:

A Sharia é a doutrina dos direitos e deveres religiosos do islã. Abrange as obrigações cultuais (orações, jejuns, esmolas, peregrinações), as normas éticas, bem como os preceitos fundamentais para todas as áreas da vida (matrimônio, herança, propriedade e bens, economia e segurança interna e externa da sociedade). Originou-se entre os séculos VII e X d.C. a partir dos trabalhos de sistematização realizados por eruditos e legisladores islâmicos e baseia-se no Corão, suplementado pela Suna, a descrição dos atos normativos do profeta Maomé. Além da Sharia e do Alcorão existe ainda a Fiqh, que é a jurisprudência islâmica e é constituída pelas decisões dos académicos islâmicos que dirigem as vidas dos muçulmanos.

Segundo a professora de política e autora de livros sobre o islamismo e as mulheres, Asma Barlas, temos que: “Independente do que se pense sobre essas leis, a verdade é que grande parte do que se considera como direito divino nas sociedades muçulmanas não se sustenta, ou, na melhor das hipóteses, tem apenas uma sustentação mínima ou específica, na palavra divina. Por exemplo, a Sharia/fiqh permite a morte por lapidação em caso de adultério, ao passo que o Corão não faz referência a essa pena em qualquer contexto (…).

E continua: “(…) O problema é que existe uma anomalia no centro da estrutura em que as leis muçulmanas foram formadas historicamente, que é a separação entre o Corão, suna, Sharia e fiqh, para não falar entre elas e costumes e tradições populares muçulmanos. Uma consequência disso é que os muçulmanos muitas vezes não sabem a diferença entre o Corão ou a Sharia (…)”.

O que a professora está tentando explicar é que o Alcorão não prega tais violências contra a mulher. Aliás, se tivermos em conta a História, verificamos que penalidades como a lapidação provém da Lei Judaica. Os Judeus lapidavam as mulheres e os homens adúlteros. É uma prática que existe na Lei de Moisés. Na mitologia cristã, Jesus foi o primeiro a contestá-la. Mas o Alcorão está longe de ser um livro melhor que as escrituras cristãs. Ele prega chibatadas em libertinos, morte aos incrédulos e outras incitações de ódio e guerra àqueles que não seguirem o que o deus da mitologia islâmica acha ser o melhor.

O que está em curso em alguns países do Oriente Médio, principalmente, é o uso de leis islâmicas por parte dos clérigos muçulmanos que deturpam as leis, interpretando-as em favor de seus planos escusos e tornando isso parte da lei e tradição locais.

O resultado de livros sagrados dúbios, clérigos misóginos e intransigentes e um povo que não contesta o que ouve ou lê, aceitando a palavra de outros como se fosse a de seu próprio deus, não podia ser muito melhor do que aquilo que vemos ocorrer em países fundamentalistas. Ou seja, mortes por enforcamento, lapidação, chibatadas e outros tipos de penalidades por motivos muitas vezes fúteis. Como ocorreu no Sudão, onde uma mulher foi sumariamente condenada a levar 50 chicotadas no meio da rua pela polícia por usar calças debaixo das vestes muçulmanas.

As chicotadas em público foram criticadas pela União de Mulheres Sudanesas, organização anti-governo que divulgou uma nota chamando o incidente de “vergonha, desonra e humilhação a todas as mulheres sudanesas”.

Mas não adianta lutar assim. Esta forma de opressão só diminuirá quando o povo acordar de seu transe e perceber que talvez a religião não tenha assim tantos direitos sobre a vida pessoal. Melhor, talvez percebam que a religião nem se refira a algo de verdade e que estão todos sofrendo e regredindo a troco de nada. Até lá, o povo e sua religião seguem sendo os algozes do bem-estar e da liberdade de si mesmos.